Boletim Agrofinanças | nº 29 | Fevereiro | 2011

 

A Prosperidade no Campo

Em nenhum momento na história do país, a agricultura fechou um ano com perspectivas tão positivas. Se olharmos para 1° de Janeiro de 2010, nem o mais otimista dos analistas poderia prever um fechamento de ano como o ocorrido. Pelo que tudo índica, de agora em diante, salvo por questões climáticas, poderemos comemorar muitos anos positivos, haja vista que, diante das condições de Oferta X Demanda na maioria dos mercados, acumulamos bons fundamentos para sustentar os preços em patamares acima dos históricos para a maioria das commodities agrícolas relevantes para a matriz de exportação brasileira. Além da conjuntura de mercado, temos ainda boas perspectivas de produtividade para as culturas perenes e a Safra Verão. Até o momento, temos uma safra de normal para excelente na maior parte do país, com problemas pontuais de estiagem que, pelo que tudo indica, não devem causar perdas substanciais.

O mais importante disso tudo são os resultados econômicos positivos, comuns a todas as culturas importantes para o país, a saber: soja, milho, algodão, cana, café e trigo além dos mercados de carnes que apresentam recordes de preço e rentabilidade. Nesse momento, não existe espaço para reclamações. Os números estimados de rentabilidade por cultura mostram com clareza o cenário positivo que cerca as contas dos produtores rurais nas diferentes regiões, conforme demonstrado no quadro abaixo.

 

É claro que os produtores devem manter o equilíbrio e os pés no chão, pois as maiores perdas da história do nosso agronegócio ocorreram em seguida aos períodos de euforia. Mas não devemos nos preocupar com situações como as ocorrências de 2004-05, pois aquele cenário dificilmente será reproduzido, já que hoje o nível de alavancagem no campo é bem menor. Em muitas regiões, os produtores vêm se capitalizando nos últimos anos, sobretudo nas regiões de soja.

A cultura do Café, por sua vez, até meados do ano passado, seguia em uma conjuntura adversa, mas agora também desfruta das altas de um mercado nervoso pelo baixo estoque e indisponibilidade de produto de boa qualidade. Problemas na Ásia e na Colômbia ofereceram as condições para a prosperidade recente dos produtores brasileiros. Apesar de problemas com “pegamento”, vamos ter uma safra de resultados positivos em 2011. 

O milho e o trigo, que começaram o ano como os “micos” do mercado, com excedentes de produção no Cerrado (safrinha), acabaram herdando uma quebra da safra de trigo na Rússia que beneficiou todas as cadeias, semelhante ao que ocorreu em 2006/07. Vale lembrar que também ouve a “mão invisível do Estado” no lançamento dos programas de proteção de preços, em particular o PEP voltado para fomentar a exportação. Nesse contexto, o volume de exportação de milho bateu novos recordes no final de 2010.

A soja acabou levando o benefício por tabela e beneficiou uma grande parcela da safra ainda não vendida, e que está sendo precificada em condições bem mais favoráveis.

O algodão está no nirvana. “Nunca na história desse país” tivemos uma conjuntura tão positiva para essa cultura. Quem sobreviveu ao período sinistro que assombrou a cultura entre 2004 2008 ganhou na loteria. Infelizmente, aproximadamente 60% dos cotonicultores ativos em 2004 deixaram essa cultura para se dedicar exclusivamente à soja e estão assistindo ao milagre das fibras pela TV. Realmente ouve um processo seletivo muito forte e quem sobreviveu a ele está se recuperando rapidamente e passou inclusive a ser target de bancos locais e internacionais que buscam espaço nesse mercado. 

No segmento canavieiro, também tivemos uma melhora substancial no cenário de preços, o que, aliado ao custo menor desta safra no quesito insumos, ampliou a margem de lucro dos produtores. No entanto vale ressaltar que, nesse mercado, os ganhos foram menos significativos que nos segmentos citados acima.

voltar para o início do boletim

Troca & Securitização

O diferencial dos preços negociados no início de 2010, sobretudo no mercado de algodão para exportação pode gerar algum stress em operações pontuais. Essa preocupação também se aplica às trocas efetuadas nesse mesmo período, ou antes, que apresentam variações de 30<=> 40% em US$. Realmente as variações são grandes e os prêmios no mercado interno acentuam ainda mais essa situação. Pelo que tudo indica 2011 deve ser um ano em que os produtores (principalmente os maiores) vão resistir um pouco a vender antecipado já que o otimismo voltou para campo. Mas as oportunidades de pré-venda e troca são boas e não devem ser descartadas pela maioria dos produtores de menor porte. As revendas de insumos e algumas cooperativas devem manter as suas políticas de oferecer hedging para os produtores.
voltar para o início do boletim


Crédito & Recebimento



Como já havíamos antecipado em Dezembro, o cenário é muito bom para o recebimento das contas da safra verão, com poucos registros de sinistro no campo, boa produtividade e rentabilidade positiva em quase todas as regiões e grandes culturas. Problemas pontuais podem ocorrer pelo excesso de chuva em alguns locais, mas nada que possa ameaçar o bom andamento das operações. A safrinha 2011 por outro lado começa a gerar preocupações, sobretudo no MT. Com as chuvas quase diárias na região o cronograma de colheita da soja está mais atrasado que o esperado o que impede a entrada da safrinha de milho dentro do melhor período. Por esse fator a safrinha deve acumular mais um atraso, já que a soja teve o final do plantio retardado em 15 dias em função da estiagem de outubro. Esse quadro eleva o risco safrinha, mas ainda é difícil avaliar qual seria o potencial impacto. É importante aguardar para ver o percentual que será plantado após o dia 20/02, que delimita o final do melhor período de plantio para o MT, de forma geral. A partir desse ponto, o risco de seca no embonecamento e granação aumenta gradualmente à medida que o atraso se acentua. Via de regra, os produtores também baixam um pouco a tecnologia dos plantios mais tardios, mas a coisa não é cartesiana. Tem gente que por já ter comprado todos os insumos, segue como o planejado independentemente do risco adicional. Mas vale lembrar que a margem que a soja vai deixar no verão, criará um “colchão” que poderia ser usado em uma eventual perda parcial. O próprio preço do milho também oferece uma oportunidade para assumir mais riscos. Ou seja, mesmo que ocorra algum impacto sobre a safrinha, não deverá representar problemas para quem quiser acelerar nas vendas a prazo. No café algum problema com o pegamento dos frutos está gerando perdas entre 15 e 25% em determinadas regiões do Sul de Minas, mas os preços vêm compensando esse impacto, mas a folga é um pouco menor que na soja/milho. 
voltar para o início do boletim

Dinâmica dos Preços

                       

MILHO

O preço do milho, no ano de 2010, apresentou comportamentos distintos nos dois semestres. O que se constata, até meados de julho, é certa estabilidade, ocasionada por um excedente de oferta nos mercados doméstico e internacional. No momento seguinte, o quadro se inverteu: a retomada das demandas brasileira e mundial jogou os preços para o alto.

No Brasil, a reação do mercado foi liderada pelas intervenções do governo, que a partir de maio dá início aos leilões. Os resultados foram positivos: as cotações internas reagem. Leves quedas, observadas em momentos isolados e causadas por fatores específicos (colheita da safrinha, problemas com estocagem, demanda arrefecida), ficaram restritas ao início do semestre. As altas do período foram puxadas pelo aquecimento da demanda no mercado externo, sobretudo devido à alta no preço do trigo e aos agentes dos mercados futuros, preocupados com a baixa relação entre estoque e consumo mundiais (18,1%).

As expectativas para o ano de 2011 são boas. Espera-se que a alta na relação consumo/oferta diminua os estoques, sustentando os preços. Para o mês de janeiro/11, o indicador ESALQ/BM&FBovespa aponta alta acumulada de 6,53% e fechamento de 30,12 R$/sc.

ALGODÃO

Corridos os primeiros sete meses do ano de 2010, foi possível constatar oscilações leves no preço do algodão. Alguns fatores domésticos causaram efeitos inesperados no mercado brasileiro durante o período, contrariando as tendências observadas lá fora.

O segundo semestre, em contrapartida, foi atípico. A alta dos preços da pluma começa a bater às portas do comprador a partir do final da primeira quinzena de agosto, na contramão do que se esperava com o avanço da colheita, resultado da demanda crescente e dos baixos estoques. Nos meses seguintes, o preço continuou subindo, e mesmo o ligeiro recuo observado em novembro não foi suficiente para impedir recordes nominais históricos.

Dezembro fechou 2010 confirmando as expectativas altistas formadas pelos agentes, que perceberam a gritante assimetria entre oferta e demanda e a menor relação estoque/consumo dos últimos 15 anos (16,06% no Brasil, 37,00% no mundo).
O ano de 2011 começa com enchente na Austrália, e com uma das principais produções de algodão mundiais comprometida, janeiro já acumula alta de 15,82% para o mercado spot, com preço de 3,3814 R$/LP.

CAFÉ

2010 foi ano de safra recorde para o café no Brasil, 48,1 milhões de sacas, 22% a mais que a temporada anterior. Entretanto, contrariando as expectativas dos agentes, o preço no mercado interno se elevou, propelido pelas elevações nos mercados internacionais. A alta lá fora foi resultado da combinação de três fatores: baixa relação entre estoque e consumo mundiais (em torno de 19,05%), aumento no consumo e problemas climáticos em outros países produtores, como é o caso da Colômbia, por exemplo.

Boas são as notícias de 2010 para o produtor brasileiro. Não bastando preços mais elevados, constatou-se, em virtude da bienalidade do café, um aumento na produtividade da ordem de 23% em relação ao ano anterior,  chegando a 23,16 sacas por hectare.

A tendência para o ano que se inicia é a mesma. Como a produção e o consumo mundiais de café arábica estão parelhos, muito provavelmente a pressão sobre os estoques será mantida, ainda mais considerando a bienalidade. Janeiro abre 2011 com a saca cotada, até o momento, em R$ 438,28 para entrega em São Paulo, acumulando, na primeira quinzena do mês, alta de 5,98% em relação a dezembro.
voltar para o início do boletim



Câmbio





                                                  


O ano de 2010 começou com câmbio valorizado, devido à forte entrada de capital estrangeiro no final do ano anterior. O quadro, entretanto, logo se reverteu. A crise que se abateu sobre a Europa no início do ano levou os agentes a especularem contra o euro e a fugirem para o dólar como porto seguro. Essa tendência induziu uma desvalorização abrupta, que atingiu seu pico em fevereiro/10, registrando 1,874 R$/US$ no dia primeiro do mesmo mês.

Iniciou-se, posteriormente, um movimento no sentido contrário. A recuperação de confiança no mercado europeu restaurou o otimismo. Além disso, captações via IPOs (Initial Public Offering, sobretudo do Banco do Brasil) engordaram as reservas nacionais, levando a um processo de valorização cambial que se estendeu até o fim de abril/10, registrando 1,7313 R$/US$ no dia 30.

No mês seguinte o mercado se deparou com uma nova tendência altista. Temendo o efeito contágio da crise grega, os agentes novamente buscam abrigo sob a tutela do dólar, fazendo com que o câmbio batesse 1,8803 R$/US$ no final do mês de maio/10, e mantivesse sua alta até a primeira quinzena de junho/10.

Apesar das altas do dólar registradas no primeiro semestre de 2010, o segundo foi marcado por um processo firme de valorização. Além da “guerra cambial” promovida pelos Estados Unidos, a entrada de divisas decorrente da capitalização da Petrobras e a recuperação da confiança nos mercados latino-americanos contribuíram para que o dólar atingisse o menor valor do ano, 1,6546 R$/US$ no dia 14 de outubro/10. Nem os novos termos estabelecidos em relação à Irlanda, Portugal e Espanha, muito menos a intensificação do ritmo de intervenções do Bacen, foram suficientes para reverter a tendência de desvalorização da moeda americana.

O que se espera para o início de 2011 é a manutenção da tendência baixista. Os esforços do governo em manter as metas de inflação levaram, no dia 19 de janeiro, à divulgação de uma taxa de juros base de 11,25%, que muito provavelmente induzirá uma maior entrada de capital volátil no país, mantendo o câmbio valorizado. Segundo o Boletim FOCUS de 21/01/2011, do Bacen, a expectativa dos agentes de mercado é de que o câmbio encerre 2011 ao patamar de 1,75 R$/US$.
voltar para o início do boletim


Viabilidade & Liquidez



voltar para o início do boletim

Jurídico

Sobre a  MP 518 de 30 de Dezembro de 2010


Muitas questões sobre a influência negativa nas relações de consumo foram levantadas no final do ano passado em relação ao Projeto de Lei n.º 263/04 que legislava sobre o Cadastro Positivo de Crédito aprovado no final de 2010 pelo Congresso Nacional. Com base nessas dúvidas que pairavam sobre o texto proposto pelos parlamentares, a Lei acabou sendo vetada pelo Governo Federal sob o argumento de que a norma proposta teria falhas com relação à regulamentação da aplicação do cadastro positivo.

Contudo, para não criar um vazio nas expectativas geradas no mercado, sobretudo no sistema financeiro, no apagar da luzes do Governo Lula, e em substituição ao projeto de Lei 263/04 não sancionada pelo Presidente, o Governo editou como dispositivo alternativo a MP 518 que disciplina a mesma matéria. Esse diploma versa sobre a formação e consulta a bancos de dados com informações de adimplemento, de pessoas naturais ou de pessoas jurídicas, para formação de histórico de crédito, autorizando a criação do cadastro positivo de crédito.

O cadastro positivo de crédito é um serviço de gestão de base de dados relativo à pessoa física ou jurídica armazenados com a finalidade de subsidiar a decisão de crédito, a realização de venda a prazo ou de outras transações comerciais a termo que representem algum risco financeiro. O cadastro positivo diferente dos cadastros existentes hoje: ao invés de listar os clientes que não pagaram pontualmente suas dívidas (negativação), listaria aqueles que cumpriram seus compromissos em dia (positivação).

Esse novo conceito promete diversos benefícios para as relações de consumo, entre elas a possibilidade de redução de juros (impulsionada por um melhor conhecimento do perfil financeiro do consumidor), mais vantagens comerciais para os bons pagadores, maior rapidez na concessão de crédito, e melhor gestão quanto ao endividamento excessivo dos consumidores.

Apesar das promessas de vantagens que a criação do cadastro positivo de crédito nos oferece, é importante avaliarmos a possibilidade desse avanço com certa cautela sobretudo com base nos efeitos  que esse sistema alcançaram nos países onde já está em uso. No Brasil, em particular na agricultura, onde fora do SNCR (Sistema Nacional de Crédito Rural) as taxas são relativamente mais altas que em outros setores da economia, o cadastro positivo poderia ter um efeito interessante para o comprador de insumos ou vendedor a termo da produção agrícola. Hoje o mercado trata a agricultura com o viés negativo, onde todos são culpados até que provem o contrário. Isso ocorre em face de um passado eivado de fraudes e problemas de inadimplência. É um setor de análise de crédito complexa onde esse tipo de serviço pode ser favorável àqueles que ao longo das safras procuraram honrar os seus compromissos. Mas é importante salientar que a inadimplência na agricultura nem sempre é justificada por questões morais, mas muita gente séria não pode pagar suas contas por caso fortuito ou força maior. Como separar isso em um cadastro positivo? Temos que refletir mais ...



Nota: A Agrosecurity não se responsabiliza pelo uso indevido do conteúdo do Boletim para efeito de definição de limite de créditos individuais ou da exposição financeira regional. Por se tratar de uma avaliação do quadro geral (médio) dos aspectos econômicos e financeiros, pode haver divergências significativas da situação real de liquidez e viabilidade de um produtor rural em particular

 Editorial
   Textos: Fernando Pimentel   Câmbio: João Marcelo Santucci 





Apoio na divulgação:  Agrolink - O portal do conteúdo Agropecuário.
 

AgroSecurity  – Todos os Direitos Reservados – 2011